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domingo, 3 de abril de 2011

O MILAGRE DAS PLANTAS NATIVAS DO AR

Por: Rômulo Cavalcanti Braga

A mãe natureza é prodigiosa em suas surpresas. Plantas epífitas ou do ar são os exemplares que não necessitam de solo. As pteridofitas como as Avencas, Cavalinhas, Samambaias, Xaxins, entre outras são muito comuns nos biomas brasileiros. As Bromélias e em especial as Tillandsias, que também são conhecidas como Airplants são as que mais se destacam nas matas. As Orquídeas também são encontradas em áreas silvestres do nosso país. Por vezes pego-me questionando-me: Como descrever um universo jamais imaginado, de plantas exóticas de tamanhos e cores que não estão registrados em nossas mentes? A cada dia de pesquisas de campo ou mesmo na Internet, encontro novos exemplares de cores, formas e origens diferentes. Este é o maior desafio quando se tenta expressar-se em palavras o que se vê e se sente ao evocar sentimentos e sensações. Uma verdadeira explosão de cores, formas e aromas extasiantes. Dotou a mãe natureza as Bromélias de recursos próprios a formar a sua volta um oásis de sobrevivência. O coaxar estridente anuncia a presença de pererecas junto à copa de uma Andiroba. Os galhos superiores dessa arvore abrigam uma coleção de Bromélias a quase trinta metros do chão da floresta. Lá no interior de uma das plantas o canto da perereca soa aos ouvidos dos pássaros. Aquele não é decerto o mundo da habitante das lagoas. O pântano distante seria sem dúvida o seu devido lugar e o de todos os demais anfíbios. Eximias escaladoras de troncos, algumas pererecas alcançam com facilidade o teto das florestas tropicais. E nessas alturas elas podem encontrar o ambiente ideal para garantia de sua existência anfíbia: um pequeno cálice, um receptáculo de águas de chuva armazenadas na parte central das Bromélias representa um fragmento do pântano longínquo. Aí se abriga uma infinidade de animais minúsculos que servirão de comida para as pererecas ao lado de outros que, obedecendo o perfeito equilíbrio de uma cadeia alimentar, acabarão por devorá-las. Uma grande variedade de plantas servem de abrigo ao mundo animal. Entretanto, poucas chegam a hospedar uma fauna tão variada e abundante como as Bromélias. Deve-se isso quase exclusivamente ao fato delas possuírem em sua parte central um depósito natural de água de chuva, utilizado pela planta através de um aperfeiçoado mecanismo de absorção. A água encontrada dentro das Bromélias, raramente apresenta um aspecto cristalino. Isso se deve a grande quantidade de detritos vegetais que o vento despeja constantemente em seu interior. Essa matéria orgânica rapidamente se decompõe, formando uma suspensão turva, cor de mate, uma excelente sopa orgânica que, absorvida por células especiais denominadas tricomas, localizadas nas paredes internas do cálice, alimenta a Bromélia. Mesmo durante as estações mais secas, as folhas dessas plantas encaminham todo orvalho e a umidade extraída do ar para o seu cálice. A planta transforma-se assim num diminuto oásis sobre as areias da restinga. As coisas que acontecem dentro desses poucos gramas de água e em torno das folhas que os retêm condensam em poucas, mas precisas imagens, o capitulo mais dramático da biologia: a luta pela vida. Desde o nível do solo ate a ponta extrema de sua inflorescência projetada para fora do cálice, a Bromélia concentra uma fauna que inclui diversos tipos de animais, que vão desde protozoários, roedores, repteis e aves. A Bromélia converte-se num complexo conjunto habitacional onde nem sempre os inquilinos terminam o dia sem entre devorem-se. Um dos mais famosos predadores que eventualmente visitam as Bromélias é o louva-a-deus. Aparentemente alheio ao que acontece nas demais dependências da planta, ele se dependura nos cachos coloridos das inflorescências, permanecendo imóvel por horas a fio, quase sempre com sua tradicional postura de reza, a espera de insetos. Um fato curioso que pode ser observado é a precaução que o louva-a-deus se aproxima de uma libélula, toda vez que ela pousa sobre uma das folhas da planta. Terão eles noção de que elas não são as presas adequadas, mas que, escondidos pela delicadeza das asas irisadas, aqueles corpos delgados e vistosos são de um outro terrível predador? Bem mais abaixo das flores nas quais o louva-a-deus aguarda o seu jantar, onde as folhas secas da Bromélia se amontoam desordenadas sobre a areia das dunas, descansa um lagarto. Ali ele não só encontra um refugio seguro como também um ótimo lugar para abrigar os seus ovos. A umidade e a temperatura constante entre o amontoado de folhas quase sobrepostas facilitam o nascimento da futura prole. Ao mesmo tempo, entre os espinhos acerados que o circundam o réptil se sente seguro, contra as aves de rapina, suas maiores perseguidoras, e que pousadas nos arbustos próximos, sentinelas implacáveis, perscrutam incessantemente os menores movimentos entre os vegetais. Os gaviões da restinga, ao lado das corujas, integram uma patrulha terrível que não da trégua aos roedores, as aves menores e aos repteis, obrigando-os a deslocamentos cuidadosos de uma planta para outra. As moitas de Bromélias atuam como um manto de defesa e é debaixo dessa superfície de folhas pontiagudas que se sucedem os rápidos encontros e acasamentos dos lagartos, bem como as devotadas ações das aves insetívoras para com suas crias – animais que escolheram a sombra da Bromélia como ambiente protetor. O cálice central da Bromélia comporta uma imensa variedade de vida. Examinando-se ao microscópio algumas gotas do seu conteúdo, encontramos um encadeamento de formas vivas que se inicia com organismos simples como as algas verdes. Tanto em filamentos de colônias como isoladas, as algas verdes povoam densamente as águas da Bromélia. Misturadas a elas inúmeras espécies de protozoários assinalam a existência elementar da vida animal. São os mais primitivos representantes de toda a escala evolutiva, que se segue com o encontro de vermes aquáticos e anelídeos aparentados das minhocas, seres que dependem sobremaneira da umidade do cálice. Antecessores dos artrópodes na evolução da vida, os anelídeos não são tão numerosos no interior da Bromélia quanto as formas lavais e ninfas de insetos. Um bom número de insetos dependem diretamente da água na primeira fase de sua existência. As larvas de mosquitos e as ninfas das libélulas são aquáticas. Quando procuram o local da desova, muitos adultos as vezes deparam com o pequeno aquário natural das Bromélias – já efervescente de vida – nele depositando os ovos de sua espécie. Assim acontece com os mosquitos cujas lavas se alimentam das algas verdes e da matéria vegetal em decomposição no interior do cálice. Em algumas áreas a espécie de mosquito que se reproduz nas Bromélias pode ser do gênero Anapheles, transmissor de um protozoário do gênero Plasmodium que causa ao homem a doença conhecida por malária. Entretanto é mais comum encontrarem-se larvas do gênero Aedes, transmissoras da febre amarela. O fato de encontrarmos esporaticamente larvas desses mosquitos nas águas das Bromélias não significa que elas representem um problema sanitário generalizado. Mas em zonas onde essas doenças ocorrem com freqüência, a água depositada no interior do cálice é tão responsável pela endemia como a das lagoas e pântanos. Existem diversos inseticidas utilizados para borrifar a água das Bromeliáceas a fim de evitar a presença de pernilongos, recomendando certos autores o extrato de tabaco. Ao lado das larvas de mosquitos encontram-se com freqüência as ninfas de libélulas. Estas podem ser consideradas como o terror das águas da Bromélia. Vorazes e predadoras, atacam qualquer organismo que se desloque em sua proximidade. As espécies maiores, geralmente encontradas em lagos e pântanos, capturam inclusive girinos – fase larval dos anfíbios – e peixinhos. As larvas da libélula as vezes apresentam no abdome estruturas foliáceas, as brânquias. Ao mesmo tempo que servem ao aparelho respiratório, as brânquias, quando empregadas na locomoção, funcionam como a cauda de um peixe. Na base do receptáculo onde os detritos se acumulam formando um lodo esverdeado e os filamentos de algas se entrelaçam em espirais descontinuas, as ninfas de libélulas escondem a parte anterior do corpo, deixando de fora apenas os finos segmentos terminais do abdome com suas brânquias foliáceas. Nesta fase as libélulas parecem então pequenas palmeirinhas aquáticas plantadas no fundo do cálice. Poucos palmos acima desse mundo aquático, encontramos um gafanhoto. Pertencendo a grande ordem dos ortópteros, tanto os gafanhotos como os grilos, baratas, louva-a-deus e bichos-paus são de certa forma freqüentes em Bromeliáceas. Eles se distribuem conforme suas predileções, ora se embainhando nas bases das folhas como certas baratas silvestres que atingem até dez centímetros de comprimento, ora saltitando sobre as extremidades das brácteas como as esperanças e os louva-a-deus. Os ortópteros são uma grande fonte de alimento que certos predadores vão buscar sobre as folhas da planta. Tanto para as aranhas como para os pássaros insetívoros, os corpos roliços e desprotegidos de algumas espécies de gafanhotos representam um verdadeiro manjar. Ao se manusear uma Bromélia silvestre na natureza, deve-se ter bastante cuidado, pois – entre outras aranhas – a armadeira é hospede habitual em algumas regiões e seu veneno pode ser fatal para uma criança. A freqüência com que se encontram nas Bromélias as aranhas da família Thomisidae é explicável pelo alto grau de adaptação que seu corpo apresenta frente as conveniências de uma existência comprimida entre folhas que estão aderentes uma a outra. Este grupo de aranhas pode correr com grande velocidade sobre as superfícies das folhas em espaços onde não conseguiríamos introduzir a lamina de uma faca. Suas patas estão dispostas de forma a permitir rápidos deslocamentos laterais, e seu abdome achata-se de tal forma que se olharmos a folha de perfil dificilmente notaremos a presença dessa habitante esparramando-se sobre a superfície. As vezes podemos até mesmo encontrar uma aranha caranguejeira nas proximidades do cálice central, já que a umidade constante do interior da Bromélia é de grande valia quando este aracnídeo efetua a ecdise (troca de pele). Todos os animais até agora apresentados podem ser encontrados acidentalmente em Bromeliáceas, mas não são considerados como verdadeiros dependentes dessa família de vegetais. A Bromélia dá de beber aos pássaros e macacos que ali saciam a sede. Muitos nascem e morrem na copa das arvores sem nunca ter posto os pés na terra firme, pois as Bromélias lhes dão as provisões necessárias as suas sobrevivências. A polinização das Bromélias na natureza ficam a cargo dos beija-flores e abelhas silvestres. Convém esclarecer que as Bromélias não são vetores do mosquito Aedes Aegypti, que necessitam de água parada e limpa para procriação. Estudos realizados pelo Instituto Oswaldo Cruz – FIOCRUZ – comprovam o fato. As Bromélias apresentam formas exóticas com uma grande diversidade de cores e flores aliadas a um perfume suave e adocicado como é o caso da Tillandsias. Algumas são tão pequenas que torna-se difícil acreditar que a pequenina planta tenha o poder de exalar tão poderoso perfume. Assim elas se constituem em importantes espécies para uso no paisagismo e na floricultura. Em conseqüência disto, são muito comercializadas. Porém, parte das plantas que se encontram no mercado, ainda são provenientes do extrativismo. Esta situação é também reflexo do pequeno número de informações sobre técnicas de propagação e cultivo. Uma das limitações é o desconhecimento do tipo de substrato e adubação adequados ao cultivo destas espécies.




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